sexta-feira, janeiro 27, 2006

Campos do Jordão

Dez da manhã. Ela abre os olhos. Com cuidado, levanta-se, pega o maço de cigarros na cabeceira da cama e o casaco. Do lado de fora do quarto, percebe que ninguém mais acordou. O inverno faz com que tenhamos mais sono. Ela abre a porta da cozinha. O sol entra e ilumina a velha mesa azul. Sentada numa cadeira de madeira e palha, ela acende um cigarro. Seus amigos ainda não viram o lugar sob a luz solar. Ele acorda e vai para o banheiro. Ela o ouviu levantar. Quando entra na cozinha, pergunta:

– Bom dia, Thaís. O que você está fazendo?

– Bom dia. Apenas lagarteando.

Rodrigo coloca água para o café no fogo. Thaís o observa.

– Venha. – ela diz.

– Aonde?

– Você ainda não viu. – ela o conduz por entre os carros estacionados. Uma escada atrás do quarto dos fundos. Thaís começa a falar:

– Quando éramos pequenos, cinco ou seis anos, minha avó trazia eu e meu primo para Campos no inverno. Desde aquela época, considero o lugar mais literário que conheço. É claro que vejo com olhos de criança, mas quando imagino uma paisagem, um clima, um pôr-do-sol, minha mente volta para cá. – eles subiam os degraus escavados no barranco. Pequenas margaridas do lado esquerdo. Pequenas rosas do lado direito. – Cuidado com os espinhos. – continuou Thaís – Aqui em cima eu brinquei, chorei, mas, principalmente, imaginei. Olhe.

Tinham alcançado um jardim no alto do morro. A toda a volta, montes cobertos de araucárias e casinhas. O sol, incapaz de espantar o frio, contentava-se em reluzir nas folhas e telhas. Um galo cantou ao longe, atrasado, como quem tenta tecer sozinho a manhã. Um perfume de pinheiros enchia o ar. A brisa gelada os obrigava a fecharem os casacos. Hortênsias, cidreiras, azaleias. Thaís recomeçou:

– É o clima ideal.

– Esse frio? – perguntou Rodrigo, espantado.

– Sim. O frio faz as pessoas se encolherem, procurarem a companhia discreta de outras, compartilharem o calor. Não há lugar para gritos ou correrias. Isso é o verão. No inverno, somos incentivados a ouvir, falar apenas o que importa, observar e pensar.

Ela olhou as montanhas.

– Tudo é tão perfeito. Como num livro.

Ele seguiu seu olhar. Os minutos passavam e uma sensação lírica a tomava. Ela o encarou.

– Eu te beijaria aqui em cima.

Silêncio.

Olharam-se nos olhos. Uma compreensão única perpassou aquele momento. Ela sentou-se e acendeu outro cigarro. Rodrigo desceu.